segunda-feira, 18 de março de 2019

2019.

segunda-feira, 18 de março de 2019
Disseram que tudo bem fazer armas com as mãos, disseram que tudo bem armar a população. Disseram que violência se combate com violência. Disseram que direitos humanos protegem apenas os bandidos. Disseram que o cidadão de bem tinha o direito de se proteger, disseram que apenas eles tinham o direito de escolher quem vive e quem vai morrer. Gritaram que a minoria deveria se submeter à maioria, berraram que a mulher, só por ser livre, era nada mais que uma vadia. Urraram que era melhor um filho morto a um filho viado, urraram que o pobre preto favelado era sempre o culpado - então atira e mata esse ladrão. 
Uma criança atirou: não se sentiram culpados. Uma mulher apanhou: deve ter merecido. Um viado foi assassinado: talvez ele tenha agido de uma maneira inapropriada. Um preto foi preso (sorte dele que não apanhou ou morreu) apenas por estar e ser. Mas o bandido rico hetero branco é apenas um garoto, não sabe o que faz, já pediu desculpas e foi inocentado. 
Eles não sabem (ou talvez saibam e neguem até o fim) que suas mãos estão sujas de sangue. "Mas eu tenho o direito de me defender" - disse o pai de família rico que sonega impostos, não paga pensão, cujo maior medo é o de roubarem seu carro importado.
"Que matem todos que ameacem meus direitos (lê-se privilégios)" - disseram sem se importar se os outros possuíam sequer o direito de ser humano. As mãos estão sujas de sangue, mesmo que jamais tenham matado um sequer. 
Minha avó sempre me disse que a palavra tem muito poder, então quem fomenta discurso de ódio nada mais é que alguém com as mãos sujas de sangue de cada preto, de cada viado, de cada pobre, de cada mulher, de cada sapatão e de cada travesti que morre em nome da higienização da sociedade, venha ela em forma de moralismo velado, venha ela em forma de preconceito. Ah, e se a criança matou ou morreu com tiro de uma arma adquirida legalmente, não se sinta menos culpado. Não é uma sociedade armada uma sociedade protegida? Então, rumo aos Estados Unidos.
As mãos estão sujas de sangue não por uma facada, mas por um discurso incentivador de ódio, violência e extermínio em prol de uma sociedade privilegiada, que canta o hino nacional nas escolas como se amasse o Brasil acima de tudo (qual Brasil vocês amam?), que legitima a padronização, que não se importa com a diversidade, que diz o que quer quando quer e pra quem quer e chama isso de opinião. As suas mãos já estão ensanguentadas quando você diz que bandido bom é bandido morto, significando que apenas o pobre é bandido merecedor da morte, como se roubar um celular fosse trágico o suficiente a ponto de perdoar e esquecer todos os crimes diários que os poderosos cometem. Suas mãos estão inundadas de sangue vermelho (ou azul?) quando a propriedade desocupada e inútil vale mais que a vida de milhares de pessoas que não possuem onde morar por conta da sociedade injusta e desigual. Suas mãos estão escorrendo morte quando você é contra o filho da empregada frequentar a mesma universidade que seu filho, quando você é a favor da agroindústria em detrimento da demarcação das terras indígenas. Sua mão está cheia de sangue desde o momento que seu voto é baseado na limpeza de uma sociedade que favorece apenas você e seus iguais. Então, desculpe-me por informar, prezado cidadão dos bons costumes, do hino nacional, da arminha com a mão, dos privilégios, do conservadorismo estarrecedor, suas mãos estão sujas com o sangue de todas as pessoas que morreram, morrem e morrerão em prol da moralidade, da suposta ordem, do purismo, da higienização , do combate ao crime seletivo de forma truculenta e da salvação falaciosa que vocês tanto almejam e pregam.

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